“Sobem os preços do pão e do dinheiro, moderam-se as previsões de crescimento, e a superstição da tribo manda uma ideia morrer por isso: há-de ser, segundo querem alguns, o “liberalismo”. Mas estarão os nossos problemas resolvidos, se houver menos gente a ler Hayek? Em Portugal, por exemplo, com um Estado que gasta o equivalente de metade da riqueza nacional, que impôs uma carga fiscal inédita para o nosso nível de desenvolvimento, que conserva um sistema de protecção do emprego dos mais rígidos do mundo, que controla as empresas de mil maneiras – será justo debitar ao tal “liberalismo” a culpa de não crescermos e haver desigualdade? E terá a solução de consistir em mais Estado e em mais controlo da vida de cada um pelo Estado?
Ah, como os compreendo, a estes desesperados penduras ideológicos da corrente “crise”. A sua táctica é velha: em vez de argumentarem, andam à procura de pretextos para declararem a morte dos adversários, poupando-se a todos os debates. É muito mais cómodo. Os chamados “liberais”, aliás, fizeram o mesmo há uma geração atrás. Lembram-se de 1989? Era o fim do socialismo, da história – e da necessidade de examinar e refutar o que os socialistas diziam. E agora não conseguem perceber Chávez e os outros chavistas latino-americanos. Do outro lado da barricada, uma parte da esquerda começou a tratar o subprime como o Muro de Berlim do capitalismo. Não se entusiasmem, porque já não é a primeira vez que se enganam. Há cerca de 30 anos, o primeiro choque petrolífero também foi acolhido triunfalmente como “a crise final do capitalismo”, “pior do que 1929”. O Vietname, como o Iraque agora, e Nixon, como Bush, ajudaram à festa. Portugal passou então ao “socialismo”. Era o vento da história. E que veio a seguir? Thatcher e Reagan. Há quem ainda não tenha percebido que a história não acaba quando nos convém.
Mas desde então não tem sido a nossa história uma terrível marcha “liberal”? É verdade que há bancos e televisões privadas. Para além disso, porém, o que vimos nos últimos 30 anos foi a transferência crescente de recursos dos indivíduos e famílias para o Estado. Em Portugal, segundo cálculos do dr. Medina Carreira, a carga fiscal em percentagem do PIB duplicou: de 18,7% em 1965 para 36,9% em 2007. Chamam a isto “liberalismo”? E, já agora, também não lhe chamem “justiça social”. Portugal, segundo o mesmo autor, foi o país da Europa em que mais aumentaram as despesas com protecção social em percentagem do PIB entre 1991 e 2002 (de 17% para 28%) – e aquele onde a desigualdade é maior e a pobreza não diminui.
Há aqui um grande equívoco. Na Europa do pós-guerra, o Estado social cresceu com a economia. Quando esta abrandou, por volta de 1973, passou a progredir através do fisco (na União Europeia a 15, os impostos em percentagem do PIB subiram, em média, de 33% em 1975 para 42% em 2000). E tem-se dado o nome de “liberalismo” à necessidade que os próprios defensores do Estado social sentiram de limitar esta progressão e de tentar relançar a economia, aumentando um pouco a margem de manobra dos empreendedores no mercado global. Mas o “liberalismo” não é a gestão do Estado social: é outro modelo social.
A esquerda “antiliberal” tenta fugir à discussão oferecendo-se, em sonhos, a cabeça do “liberalismo”. Do outro lado, também não há mais frontalidade. A direita dita “liberal” prefere fingir que os seus projectos são uma simples questão de “bom senso”, quando não os disfarça, como em Portugal, com os títulos do adversário (“social-democracia”). Há, neste momento, dois obstáculos a qualquer debate político interessante. Em primeiro lugar, a relutância de todos em assumirem o reverso do que propõem. O Estado social implica o controlo da vida de cada um pela burocracia – embora possa haver leis a garantir os indivíduos. O modelo cívico liberal pressupõe que cada um assuma as responsabilidades e enfrente as consequências das suas opções – embora possa haver instituições para impedir sofrimentos. Em segundo lugar, confunde-se o que se está a propor. O Estado social e o liberalismo não são receitas técnicas para diminuir a desigualdade ou para aumentar a riqueza. Não existem essas receitas – se existissem, não haveria debate, porque todos escolheríamos imediatamente o que nos garantisse maior conforto e maior igualdade. O liberalismo e o Estado social são maneiras de viver diferentes. E, em vez de andarmos a diagnosticar “crises” uns aos outros, talvez fosse melhor tentarmos esclarecer o que podemos e gostaríamos de fazer com as nossas vidas.”
Archive for 28 de Maio, 2008
“Crise? Só se for dos outros”, de Rui Ramos no Público
Posted in Política, Sociedade on Maio 28, 2008| Leave a Comment »
Quiz Político
Posted in Curiosidades, Política on Maio 28, 2008| Leave a Comment »
Voltei a ter resultados “excessivos” no teste Quiz Político:
“De acordo com suas respostas, o perfil político no qual você se enquadra é… liberal.
Os liberais/libertários entendem que as pessoas são iguais em direitos e que o governo toma muitas decisões que deveriam ser tomadas pelos próprios indivíduos. Diferentes dos conservadores de direita, os liberais acreditam que a moral não deve ser imposta pelo governo, mas que as pessoas devem ser livres para buscar a verdade e a felicidade, pois uma ação só pode ser verdadeiramente virtuosa se decorrer da livre escolha. E, ao contrário da esquerda, os liberais entendem que, numa economia livre do protecionismo estatal, o lucro de uma pessoa corresponde à satisfação da necessidade de outra, gerando prosperidade para toda a sociedade.”
pode fazer o teste aqui: http://www.ordemlivre.org/node/153 .
How Liberal Or Conservative Are You?
Posted in Curiosidades, Política on Maio 28, 2008| 5 Comments »
O meu perfil político:
“Overall: 80% Conservative, 20% Liberal
Social Issues: 75% Conservative, 25% Liberal
Personal Responsibility: 50% Conservative, 50% Liberal
Fiscal Issues: 100% Conservative, 0% Liberal
Ethics: 75% Conservative, 25% Liberal
Defense and Crime: 100% Conservative, 0% Liberal ”
(Nota: “liberal” é encarado neste teste na acepção americana, ou seja, de esquerda ou democrata e “conservador” de direita, i.e., republicano).
Pode fazer o seu teste aqui: http://www.blogthings.com/howliberalorconservativeareyouquiz/ .